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quinta-feira, setembro 01, 2005

O amanhecer do Pecado

Era tarde, pensei eu. Tarde demais para me encontrar contigo de novo. Umas 22.30 e, agora, dificilmente ias aceitar o meu convite.
De qualquer das formas, logo que a janela com o teu nome piscou:

"Queres cometer uma loucura?"

Aceitas-te e em 5minitos estava á tua porta com o carro do meu pai. Pediste licença para entrar mesmo sabendo que mulheres como tu não precisam de licença para nada. Sempre foste educada.
Deste-me os beijos da praxe mas um teve um sentido diferente. Se calhar não o sentido que lhe querias dar mas. Não apenas para o ar. Foi um beijo, na minha bochecha mal barbada, com a força da saudade (espero). Tinhas um sorriso de orelha a orelha que me contagiou.
Falaste imenso durante a viagem, o que nunca fora normal nos nossos encontros.

Desde o estacionar até a entrada do shopping falaste mais sobre ti do que em 3 anos de cafés esporádicos (pelo menos). Soube o que quis saber antes, e o que não queria ouvir agora. Já devia de ter desconfiado que o charme não existe para (se) ficar só.

Não queria manchar a noite a falar dos cacos do meu coração. Já estou farto de os contar, e recontar. E tu foste perfeita. Deixavas-me embriagar com as tuas palavras, com aromas de todo o mundo. Aromas dos sítios por onde viajaste durante este verão, e das cavernas onde o teu coração andou este ano.
O segurança corpulento interveio na conversa e tivemos de sair. Fomos para onde todos os casais com falta de imaginação vão, para a beira rio.

Falámos durante largas horas, pela noite fora. Sem medo de deixar o silêncio entrar pela conversa adentro. Da voz desafinada do Karaoke longínquo que me adulterava as ideias.

A certa altura despi o casaco para me deitar com a cabeça sobre ele. De modo a ver-te, de baixo para cima, lado a lado com as estrelas. Onde pertences.
Perguntaste vezes sem conta se tinha assim tanto calor, para não vestir o casaco. E ofereceste o colo para o poder vestir. Vestir o casaco, e o colo também. Porque o colo não é casaco, mas também aquece.

- Não obrigado. Não quero pecar. - respondi ingenuamente.

Depois de alguma discussão, e de uma surpreendente insistência da tua parte...aceitei. Concordei deitar-me com a cabeça apoiada no teu joelho. Assim não estaria a pecar...assim tanto.
Não sei se eras tu se era a minha ingenuidade. Mas volta e meia tinha a cabeça no teu colo, para depois a colocar assim a meio caminho. Entre o joelho e o colo propriamente dito. Alegaste que devia de estar pouco confortável. Quase a cair, com a cabeça no joelho. E nem sabias como estavas enganada. Há tanto tempo que não me sentia tão bem. Tão calmo, tão Zen. Como na Rota do Chá (no Porto).

- Sabes o que eu lamento...é que esta noite vai acabar.

A viagem para casa foi lenta. Muito lenta. Apesar das 5h queria aproveitar ao máximo o que restava da noite. Cumpri todos os limites de velocidade e mais alguns. E quando cheguei a tua porta ficamos outro tanto a falar.
Estavas tão séria, com um ar tão cansado e ao mesmo tempo terno. Que sinceramente temi que não avisasses.

"- E se te beijasse agora?" - como me disseste há uns anos.
Que saltasses a deixa. O Acto inteiro e partisses para a ultima cena.

Mas não o fizeste. O charme tem destas coisas.

(e tu, pa variar, fizeste.m pensar!!! )


E se as horas não importassem? Se te levasse dali para fora, Sta Apolónia fora? Ultrapassando todos os noctívagos do Lux e afins. Marginal abaixo até á praia. Um galão e uma sandes de fiambre.
Se te pegasse ao colo com os pés enterrados na areia. Deixar-me ir. Deixar-me cair, rebolar na areia contigo. Beijar-te de roupa salgada, sob os primeiros raios de sol. Os últimos da noite.


Mas não...Não obrigado. Não quero pecar.