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sexta-feira, novembro 11, 2005

O primeiro amor




A peça tardava em começar, e aproveitei para ler os folhetos que estavam em cima da mesa. Um troço de texto saltou-me à vista e entranhou-se em mim.

Dei por mim, minutos mais tarde, a repetir as mesmas palavras. Enquanto Miguel Borges gritava, eu sussurrava...

"Naquela altura eu não percebia as mulheres.
Aliás, agora também não.
Nem os homens. Nem os animais.
O que percebo melhor, e não é dizer muito, são as minhas dores."


Na altura, senti um arrepio que julguei ser causa da exímia representação do actor.
Hoje aproveito para acrescentar as palavras que precedem estas mesmo, e que na altura não dei importância...

"Penso-as todas, todos os dias, não demora muito, o pensamento corre tão
depressa, mas não estão todas no pensamento, nem todas.
Sim, há momentos, especialmente à tarde, em que fico todo sincretista, à la
Reinhold. Que equilíbrio!
Aliás, também as percebo mal, às minhas dores.
Deve ser por causa de eu não ser todo dor.
Eis o estorvo."


in "O primeiro amor" de Samuel Beckett.

Para V. F. e C., por me recordarem as dores que são minhas...
que as percebo mal...
... e que, por isso, não sou todo dor.

1 Comments:

Blogger Cucu said...

Tens meio mundo a escrever e a falar sobre as suas "dores"... se não fossem essas "dores" ninguém seria o que é hoje. Seriam um outro "alguém" diferente, com outro penar que não esse... porque da vida faz parte o bom e o mau, o compreensível e o incompreensível. Mas, às vezes, compreender o que está à frente dos olhos pede-te que esperes, respires fundo e vejas, observes, o que acontece... sem juízos de valor, sem (falsas) considerações, simplesmente ver para compreender! (Ou, pelo menos, tentar...)

Peace! ;)

11/11/05 21:15  

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